Quando Cósme Polêse assumiu a presidência da distribuidora local de gás natural canalizado em outubro de 2011, sua alma planejadora rapidamente percebeu que uma realidade precisava ser enfrentada neste setor de infraestrutura: a concentração da oferta do insumo na vertente Atlântica catarinense fruto da dinâmica urbana-industrial desse espaço.
Com uma formação ideológica voltada à preocupação social e o desenvolvimento regional igualitário, a partir de premissas que sempre pautaram suas atividades públicas no Estado, trouxe consigo o conceito de descentralização, inspirado pelo exemplo alemão de administração pública que prega um modelo gerencial de compreensão das localidades e independência orçamentária.

Sua interpretação acerca da distribuição do gás natural, a qual, em justa homenagem, denomino como via polesiana, colocou as atividades do setor em três pilares principais: desconcentração e ampliação da oferta, inovação e competitividade. Vale dizer que essa interpretação deu-se a partir de muitos estudos sobre o setor no mundo e no país e, também, pela vivência empírica que foi potencializada por uma ampla agenda de visitas técnicas realizadas no Estado.

Para desconcentrar a oferta, mesmo considerando os desafios regulatórios da época, estabeleceu alguns premissas para avançar com o projeto Serra Catarinense (que previa implantar a rede de Indaial a Lages pela BR-470), grande ferramenta colocada para que o gás avançasse para territórios mais a Oeste. Entre elas, a execução de obras em duas frentes ligando municípios equidistantes, com mais de um contrato de serviço para implantação dos gasodutos e uma incansável análise da realidade local para definir os melhores trechos para os novos ramais.

Polêse sabia que, pelo atual modelo estabelecido no antigo contrato de concessão do serviço, que opera ainda com uma lógica atrasada da década de 1990, nas grandes redes estruturantes, a chegada ao último município exigiria muito tempo, em razão da capacidade de investimento da concessionária. Um exemplo é o próprio projeto Serra, com traçado de 230 quilômetros de rede previstos para serem implantados. Por isso, trouxe, a partir da experiência vivida no Norte de Portugal, o modelo de rede local e isolada de oferta do insumo que opera em regiões de baixo consumo e distantes dos grandes centros urbanos.

A vivência portuguesa permitiu a chegada antecipada do gás à Lages, por meio deste modelo chamado de gasodutos virtuais. Irá permitir da mesma forma que uma antiga demanda do ramo papeleiro seja atendida, nas cidades de Canoinhas e Três Barras no Planalto Norte. E, ainda, possibilita com que se sonhe com o gás presente em todo o Oeste e quem sabe aos extremos de todo mapa catarinense, projeto aliado ao utópico objetivo da universalização da oferta do insumo no território catarinense.

Ainda no campo da oferta e considerando a necessidade de ampliação de suprimento, buscou alternativas às limitações do Gasbol, que opera dentro do limite da capacidade de transporte e, mais recentemente, até mesmo puxando volumes acima do contratado junto ao supridor. Buscou a atração de investimentos para implantação de Terminal de GNL (Gás Natural Liquefeito) com opções para o Sul no porto de Imbituba e para o Norte, em São Francisco do Sul. Como produto das agendas de aproximação com potenciais investidores, a Baía da Babitonga será berço para a recepção do gás líquido ainda em 2022, uma infraestrutura que ampliará o volume de abastecimento de Santa Catarina em mais de 170%. O importante papel do Atlântico para a realidade portuguesa, com o porto de Sines sendo a infraestrutura que recebe o GNL para a interiorização do insumo naquele país, também inspirou esse movimento político-institucional.

Não esqueceu também de um ponto importante da formação socioeconômica de Santa Catarina: setores diversificados e pequenas propriedades produtivas. Como bem desvendou a singular geógrafa catarinense, professora Dra. Isa de Oliveira Rocha da nossa UDESC, ao comparar o Estado com a realidade do Nordeste estadunidense a partir das singulares interpretações leninistas. O gás natural deve atender todos os diversos ramos industriais, de forma competitiva, para inclusive dar conta da desigualdade enfrentada por outros setores de infraestrutra como o portuário, rodoviário e ferroviário, em especial atrelada à dinâmica da competição regional com os estados de São Paulo e do Rio de Janeiro.

A via polesiana garantiu, no período (2012-2018), a tarifa de gás natural mais competitiva do Brasil, dando conta de uma importante premissa de ter seu foco de atenção também ao mercado abastecido. Afinal, o setor do gás natural catarinense atende 50% do PIB industrial do Estado, 40% das mais de 330 indústrias competem no mercado internacional e grandes marcas catarinenses devem contar com o esforço da concessão pública para evitar o eventual deslocamento ou desaparecimento de importantes clusters produtivos, que são também fruto indissociável da nossa rica colonização e da própria realidade geográfica do território.

O legado deixado por este período de quase oito anos de gestão, que provoca a reflexão constante do setor público e dos agentes promotores de infraestrutura, enfrentou uma realidade que se materializou em Santa Catarina com alguns singulares exemplos que poderiam ter sido evitados. A extinção e deslocamento de fábricas de telhas em Sombrio no extremo Sul do Estado por ausência de oferta do insumo; o deslocamento do projeto de implantação de uma grande fábrica de vidros planos de Lages para Barra Velha, deixando, como consequência, de gerar empregos em um município mais deprimido e de baixo IDHM; e um forte processo de desenvolvimento em Araquari com a instalação de uma fábrica montadora automotiva, que garantiu a implantação de novas indústrias em uma região destacadamente desenvolvida como a Norte.

Autor: Leonardo Mosimann Estrella - Administrador e Jornalista